O afrofuturismo é um movimento em ascensão que visa a difusão e ampliação de estéticas e culturas africanas através da união de códigos tribais e de ficção científica
Sociedade e ressignificação cultural
Os desdobramentos da sociedade no século XXI no que diz respeito às transformações culturais, artísticas e sociais são um fenômeno em ascensão na contemporaneidade e frutos de um hibridismo sociocultural onde a necessidade de entendimento e respeito às diversidades tornam essas interconexões possíveis.
Os aspectos simbólicos vigentes nesse contexto são importantes para a compreensão dos movimentos de valorização e exaltação da cultura africana. Para Stuart Hall, “a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, a medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente”. O Afrofuturismo surgiu nesse contexto como uma soma de potências, da união da estética hi-tech futurística a traços étnicos repletos de ancestralidade e referências históricas.
Black to the future
Segundo relatos, o movimento surgiu na década de 30 em uma experiência alucinatória do músico de jazz, poeta e “filósofo cósmico” Sun Ra, que, em um momento de epifania, imaginou um futuro em que a sociedade absorveria a representatividade negra. Porém o termo “afrofuturismo” foi empregado pela primeira vez somente anos mais tarde pelo teórico e crítico cultural Mark Dery. Dery, um homem branco, que em 1994 publicou um ensaio intitulado Black to the future, literatura de ficção científica que vislumbrava o futuro social dos negros, classificando a obra como afrofuturista.
Quando alguns personagens da cultura negra começaram a ter destaque na mídia, o movimento se expandiu e ganhou mais notoriedade. As influências do afrofuturismo são abrangentes e por isso contemplam diversas vertentes das artes, como música, pintura e cinema. Podemos citar como exemplo a primeira mulher negra a ganhar visibilidade como escritora de ficção cientifica Octavia Butler, o renomado artista plástico Basquiat, o diretor de cinema Spike Lee, a atriz Lupita Nyong’o e a cantora e compositora Beyoncé.
Além disso, mais recentemente surgiram no cenário musical artistas como Petite Noir, músico e produtor radicado em Cape Town, África do Sul, que inaugura o estilo por ele denominado “noirwave”, literalmente onda negra em uma mistura de francês e inglês. Em entrevista ao site The Fader, Noir afirma “com o noirwave eu estou desafiando a forma como fomos treinados a pensar que tudo que é branco é inovador”. Durante muito tempo artistas brancos foram celebrados por repensar materiais globais porém, com o avanço da internet a hegemonia ocidental vem perdendo espaço enquanto outras culturas, em especial a africana, conquistam terreno e tem acesso a costumes de outros povos inspirando-se neles assim como serviram de inspiração.
Afrofuturismo e a moda
No cenário da moda o afrofuturismo vem aparecendo com cada vez maior frequência. A cantora americana Beyoncé usou a grife francesa Balmain no festival de música Coachella de 2018. O look, uma releitura da rainha egípcia Nefertiti, trazia elementos geométricos destacados em dourado, prata e pedrarias. O jornal The New York Times afirmou que o show da cantora “foi tanto tributo ancestral quanto continuidade cultural – uma elevação da feminilidade negra – como um concerto contemporâneo”.
A Nataal Magazine é referência em conteúdo referente à cultura e à sociedade africanas englobando moda, música, artes visuais e turismo. A linguagem estética e escrita comunicam uma perspectiva de visão alternativa da estrutura social africana, propondo uma narrativa positiva onde o estereótipo africano é dissolvido.
O filme da Marvel “Pantera Negra” também trouxe a indumentária africana como um dos elementos mais marcantes da sua narrativa, que se passava na cidade fictícia de Wakanda na África. O figurino do filme, que está concorrendo ao Oscar, foi inspirado em diversas tribos espalhadas por todo continente africano. Tons de vermelhos terrosos vieram do povo Himba, do noroeste da Namíbia, marcas dos corpos de guerreiros remetem à tatuagens e cicatrizes das tribos Surma e Mursi da Etiópia enquanto que a coroa utilizada pela rainha Ramonda assemelha-se aos acessórios de cabeça usados por mulheres casadas do povo Zulu. Wakanda , por sua vez, é o nome de um dos temas da nossa coleção de verão que foi inspirada no afrofuturismo.